Ouçam-me bem, bando de snobs: todos estamos errados ao venerar as carreiras que se estendem por décadas, as obras completas que enchem bibliotecas inteiras, os artistas que tiveram tempo para polir a sua reputação até à perfeição. Joel Elenberg lembra-nos com uma brutalidade marcante que um génio pode explodir em três anos de criação pura e deixar um legado que desafia o tempo. Morto com trinta e dois anos numa villa balinesa em 1980, este escultor australiano comprimou toda uma existência artística no período entre a sua descoberta do mármore em 1977 e a sua prematura morte. Mas que compressão! Como um diamante formado sob uma pressão extrema, a obra de Elenberg brilha com uma intensidade que poucos artistas atingem numa vida inteira.
Nascido em 1948 em Melbourne numa família judia de Carlton, Elenberg possuía aquela energia desenfreada que caracteriza os verdadeiros criadores. Os seus próximos lembram-no a percorrer as ruas elegantes da Lygon Street, oferecendo-se os fatos italianos mais caros na Delmonicos, cultivando um estilo que o fazia uma figura lendária no bairro boémio de Carlton. Essa elegância natural, essa capacidade de transformar o comum em extraordinário, encontramos-na intacta nas suas esculturas de mármore. Elenberg começou pela pintura, mas mal tocou na pedra encontrou o seu meio. “Um pincel nunca poderia conter pigmento suficiente para aquilo que quero dizer” [1], declarava ele com a lucidez que caracteriza os artistas tocados pela graça.
A história de Elenberg não pode ser separada da de Constantin Brâncuși, o mestre romeno que revolucionou a escultura moderna. Quando Anna Schwartz, companheira de Elenberg, declara que “Brâncuși foi o artista mais influente no trabalho de Joel. Podemos ver fortes influências neste tipo de forma de Brâncuși e essa base é muito brâncusiana” [2], ela toca no coração de uma filiação espiritual que ultrapassa a simples influência estética. Brâncuși estabeleceu um princípio revolucionário: a escultura devia revelar a essência das coisas e não a sua aparência. “O que é real não é a forma exterior, mas a essência das coisas”, afirmava o mestre. Elenberg integrou essa filosofia na sua própria carne artística, mas acrescentando-lhe uma dimensão telúrica que lhe é própria.
O período italiano de Elenberg, de 1977 a 1980, representa o auge desta síntese criadora. Convidado por Arthur Boyd para ocupar a sua villa toscana Il Paretaio, depois fixou-se em Carrara no estúdio SGF dirigido pelos artesãos Silvio Santini, Paolo Grassi e Mario Fruendi, Elenberg descobriu um universo onde a tradição milenar da talha do mármore encontra a vanguarda contemporânea. Esta colaboração com os mestres carrareses revela um aspecto essencial da sua personalidade artística: ao contrário da imagem romântica do escultor solitário, Elenberg era profundamente social, capaz de criar pontes entre culturas e gerações. Os testemunhos relatam que os artesãos italianos diziam dele que tinha “mãos mágicas”, reconhecimento máximo numa profissão em que a virtuosidade técnica é transmitida de mestre para aprendiz desde o Renascimento.
A obra em mármore de Elenberg revela uma compreensão profunda das lições brâncusianas, mas também uma capacidade notável para as adaptar à sua sensibilidade pessoal. Tomemos o seu Totem de 1979, montagem sofisticada de mármore branco statuario e Rosso di Portogallo vermelho sangue. Esta peça incorpora perfeitamente a filosofia brâncusiana da essência revelada, manifestando também uma abordagem única da cor e da simbologia. O contraste cromático entre o branco puro e o vermelho óxido evoca, nas palavras de Anna Schwartz, “o sangue e o corpo humano” [2]. Mas para além desta leitura literal, a obra funciona como um sistema de tensões dinâmicas onde cada elemento geométrico dialoga com os outros num equilíbrio precário e poético.
A técnica de Elenberg revela uma mestria surpreendente para um artista tão jovem. As formas redondas do Totem foram torneadas, a incrustação realizada à mão com uma roda diamantada, processo complexo que não tolera erro. Esta virtuosidade técnica ao serviço de uma visão artística clara aproxima Elenberg de Brâncuși, mas também da tradição dos mestres escultores do Renascimento. Tal como eles, compreende que a técnica nunca é um fim em si mesma, mas um meio para alcançar uma verdade espiritual superior. As suas Head III de 1978 e as suas várias Mask testemunham esta busca constante por um equilíbrio entre virtuosismo formal e força expressiva.
É aqui que entra a dimensão junguiana da obra de Elenberg, dimensão que ilumina de forma nova a sua fascinação por máscaras e totens. Carl Jung desenvolveu o conceito de arquétipos, essas imagens primordiais que habitam o inconsciente coletivo da humanidade. Para Jung, algumas formas artísticas possuem uma ressonância universal porque se alimentam deste reservatório comum de símbolos e significados. As máscaras de Elenberg, com as suas superfícies polidas que refletem a luz como espelhos, funcionam precisamente como arquétipos junguianos: evocam simultaneamente as máscaras mortuárias da Antiguidade, os totens das culturas oceânicas e os rostos estilizados da arte africana tradicional.
Jung ensinava que a individuação, o processo pelo qual uma pessoa se torna plenamente ela própria, passa pela confrontação com a sombra, essa parte obscura e reprimida da personalidade. As últimas obras de Elenberg, criadas quando sabia da sua doença incurável, parecem incorporar essa confrontação com a sombra. Brett Whiteley, seu amigo íntimo, sugeria que estas obras finais podiam ser compreendidas simbolicamente “como uma tentativa majestosa de prestar homenagem à grande verdade misteriosa que cada um de nós, no seu tempo, deve encontrar” [3]. Esta dimensão escatológica confere às máscaras de Elenberg uma profundidade que ultrapassa amplamente o exercício de estilo ou a pesquisa estética.
A psicologia junguiana ajuda-nos também a compreender a atração de Elenberg pelas formas totémicas. Jung via nos totens objetos de mediação entre o mundo consciente e o inconsciente, suportes de projeção para os conteúdos psíquicos reprimidos. O Totem de Elenberg, com a sua verticalidade assertiva e formas geométricas encaixadas, funciona como um axis mundi, um eixo cósmico que liga a terra ao céu, o material ao espiritual. Esta dimensão sagrada não é casual: enraíza-se na fascinação de Elenberg pelas culturas primeiras, a sua “empatia particular pelos povos das Primeiras Nações” e a sua paixão pela “arte africana antiga e a arte do passado longínquo” [2].
A análise junguiana revela também porque as obras de Elenberg continuam a exercer uma atração tão poderosa sobre o público contemporâneo. Jung distinguia dois modos de criação artística: o modo psicológico, que reflete as realidades da vida quotidiana, e o modo visionário, que “rasga de cima a baixo o véu sobre o qual é pintada a imagem de um mundo ordenado e permite entrever o abismo insondável do que ainda não se tornou” [4]. As esculturas de Elenberg pertencem resolutamente ao modo visionário: confrontam-nos com formas que parecem emergir de um tempo primordial, ao mesmo tempo que evocam um futuro tecnológico que ainda não sabemos nomear.
Esta temporalidade dupla, que faz coexistir o arcaico e o futurista, constitui uma das assinaturas mais reconhecíveis do estilo de Elenberg. As suas Head III e várias Mask evocam simultaneamente as esculturas africanas em ébano, as máscaras japonesas do teatro Nô e os capacetes de ficção científica. Esta polyvalência temporal não é fruto do acaso: reflete a capacidade única de Elenberg em extrair do inconsciente coletivo para criar formas que falam à nossa época, mantendo o seu enraizamento na memória ancestral da humanidade.
A dimensão junguiana da obra de Elenberg ilumina igualmente a sua relação particular com a matéria. Para Jung, a transformação alquímica, essa transmutação do chumbo em ouro perseguida pelos alquimistas medievais, constituía uma metáfora perfeita do processo de individuação. O alquimista não se contentava em transformar a matéria: transformava-se a si próprio no processo. Elenberg trabalha o mármore com essa mesma consciência alquímica. Não se limita a esculpir a pedra: metamorfoseia-a revelando as suas qualidades ocultas, a sua capacidade de capturar e refletir a luz, a sua sensualidade tátil que desperta o desejo de acariciar as superfícies polidas.
A utilização do mármore negro belga em várias das suas peças atesta esta abordagem alquímica. Esta pedra rara e difícil de trabalhar torna-se, sob as suas mãos, num material de extraordinária profundidade ótica, capaz de absorver a luz, criando reflexos subtilíssimos. A alternância entre o preto e o branco dos mármores era percebida pelo artista como “a representação dos dois pólos da vida”, nova manifestação desta dialética junguiana entre sombra e luz, inconsciente e consciente, que atravessa toda a sua obra.
A trajetória fulgurante de Elenberg interroga-nos sobre a natureza do tempo artístico. Em três anos de criação intensiva, produziu um corpus que rivaliza com as obras de artistas que trabalharam durante décadas. Esta compressão temporal não é acidental: revela uma urgência existencial que confere a cada obra uma intensidade singular. Sabendo da sua doença mortal, Elenberg viveu os últimos anos numa aceleração criativa que evoca as últimas sonatas de Beethoven ou os últimos autorretratos de Van Gogh. Esta consciência da finitude aguça a visão artística até atingir uma acuidade profética.
A exposição “Joel Elenberg : Stone Carving 1977-1978, Italy-Australia” na Robin Gibson Gallery em Sydney, em outubro de 1978, marca o auge deste período criativo. A crítica Nancy Borlase escreveu então que “a exposição recoloca a escultura no seu pedestal, reafirmando o seu estatuto precioso de arte nobre” [5]. Este reconhecimento crítico surge no momento em que Elenberg domina perfeitamente a sua linguagem plástica, onde a síntese entre influências brâncusianas e visão pessoal atinge o seu equilíbrio mais completo.
No entanto, o que torna a obra de Elenberg verdadeiramente única é a sua capacidade de transformar essa síntese cultural numa linguagem pessoal. Onde outros poderiam ter-se limitado a imitar Brâncuși ou a reproduzir as formas da arte primitiva, Elenberg cria um vocabulário plástico original que carrega a sua assinatura espiritual. As suas máscaras não são cópias de objetos africanos nem variações sobre temas brâncusienses: constituem criações autênticas que se inspiram nessas fontes para inventar algo inédito.
Essa autenticidade criativa explica por que mercado de arte reconheceu o valor excecional das obras de Elenberg. Em 2023, a sua “Mask (1)” de 1978 alcançou 550.000 euros em leilão [6], mais do que o dobro da estimativa máxima, estabelecendo um novo recorde para o artista e confirmando o seu lugar no panteão da escultura contemporânea australiana. Mas para além dessas considerações mercantis, é a persistência da emoção estética que constitui o verdadeiro teste da grandeza artística. Quarenta e cinco anos após a sua morte, as esculturas de Elenberg continuam a provocar essa “perturbante estranheza” que Freud associava às obras-primas autênticas.
O legado de Elenberg coloca questões importantes sobre as relações entre tradição e inovação na escultura contemporânea. Numa época em que a arte conceptual dominava as vanguardas internacionais, Elenberg optou por retomar a tradição milenar da talla direta, ao mesmo tempo que a insuflava com uma sensibilidade resolutamente moderna. Esta posição pode parecer conservadora, mas revela na realidade uma inteligência artística rara: aquela que compreende que a verdadeira inovação não nasce da ruptura pura, mas da reinvenção criadora da tradição.
O percurso de Elenberg também ilustra a importância dos encontros na formação de um artista. A sua relação com Brett Whiteley, a sua amizade com Arthur Boyd, a sua colaboração com os artesãos de Carrara, a sua cumplicidade com Anna Schwartz: tantos laços humanos que alimentaram a sua criação e lhe permitiram desenvolver a sua linguagem artística num contexto de intercâmbios frutíferos. Esta dimensão relacional da arte, muitas vezes negligenciada pela crítica, constitui, no entanto, um aspeto essencial da criação contemporânea.
Hoje, enquanto a escultura contemporânea explora novos materiais e novas tecnologias, a obra de Elenberg relembra-nos que a verdadeira inovação artística não reside na novidade dos meios, mas na autenticidade da visão. As suas esculturas em mármore, criadas com técnicas milenares, falam ao nosso tempo com uma acuidade que nem sempre as instalações tecnologicamente mais sofisticadas alcançam.
O exemplo de Elenberg ensina-nos também que a brevidade de uma carreira não constitui necessariamente um obstáculo artístico. Como Basquiat, como Raduan Nassar, como todos esses criadores que foram interrompidos no seu ímpeto, Elenberg conseguiu concentrar em poucos anos uma intensidade criadora que compensa largamente a brevidade da sua produção. Essa economia de meios, essa capacidade de ir ao essencial sem se perder em repetições, constitui talvez a marca dos temperamentos artísticos mais puros.
A obra de Elenberg confronta-nos finalmente com uma verdade perturbadora: a arte autêntica nasce frequentemente do confronto com a finitude, com esta consciência aguda da morte que aguça a perceção e intensifica a expressão criativa. As suas últimas esculturas, criadas na sombra da doença, alcançam uma densidade emocional que poucas obras de arte conseguem igualar. Elas lembram-nos que a arte, para além das suas dimensões estéticas e conceptuais, constitui antes de tudo uma vitória sobre o tempo, uma forma de inscrever na matéria uma visão que sobreviverá ao seu criador.
Joel Elenberg partiu aos trinta e dois anos, mas deixou-nos um conjunto de obras que continua a interrogar-nos e a comover-nos. Nos seus mármores polidos, nas suas assemblagens geométricas, nas suas máscaras enigmáticas, encontramos essa “grande verdade misteriosa” de que Brett Whiteley falava. Uma verdade que nos concerne a todos, que nos liga às nossas origens mais remotas e aos nossos destinos mais secretos. É isto o génio de Elenberg: ter sabido cristalizar na pedra essa parte da eternidade que dorme no coração da nossa condição mortal.
- Menzies Art Brands, “Joel Elenberg”, www.menziesartbrands.com/blog/joel-elenberg, site visitado em julho de 2025
- Anna Schwartz in Queensland Art Gallery, “Anna Schwartz reflects on Joel Elenberg’s work”, 2024.
- Brett Whiteley citado em Deutscher and Hackett, “Mask, 1979”, catálogo de venda, 2011
- Carl Jung, “O Homem à Descoberta da Sua Alma”, 1939
- Nancy Borlase, “The Weekend Australian”, 14-15 de outubro de 1978
- Artprice, “Resultados das adjudicações para as obras de Joel Elenberg”, site consultado em julho de 2025
















